domingo, 5 de setembro de 2021

(Capítulo 7) A INTRODUÇÃO E A NARRAÇÃO DO SERMÃO...

O conteúdo bíblico-teológico do Sermão, conforme já vimos, está inserido no tema e nas argumentações. O pregador já estudou o texto, pesquisou o máximo possível, chegou a um tema relevante e interessante, colocou as divisões e montou todo o "corpo" do sermão, Agora chegou a hora de preparar o ouvinte para receber esse conteúdo. Essa é a função da Introdução. "Um bom sermão abre o apetite mental do ouvinte nas primeiras palavras. Assim que começa a mensagem, o bom pregador lança palavras aperitivas, que deixam o ouvinte com água na boca para ouvir o sermão. Essas palavras aperitivas são chamadas introdução."

Certa vez, uma senhora reclamou de um determinado pregador e, quando a questionei sobre qual era o problema, ela disse: "Esse pregador é sem educação que nem cumprimentou a igreja". Esse problema aconteceu porque o pregador leu o texto e já começou lançando o tema, passando para as argumentações. Na verdade, ela sentiu falta de um simples "boa noite" quando o pregador assumiu a palavra, mas o que pude discernir é que a sua falha foi não ter pensado em uma boa introdução. Na linguagem de Bryan Chapell, "A introdução é o aperto de mão do bom intento do pregador. Com estas palavras de abertura o pregador da as boas-vindas aos ouvintes interessados no sermão, enquanto lhes assegura que é importante e bom o que estão a ponto de ouvir." 

A. OS OBJETIVOS DAS INTRODUÇÕES 
A introdução tem vários objetivos e propósitos, Apresento aqui um resumo e adaptação da exposição de Bryan Chapell sobre os objetivos das Introduções, a fim de ressaltar a importância dessa parte inicial do sermão:

O primeiro objetivo da Introdução é despertar o interesse pela mensagem - quando o ouvinte chegou à igreja, ou local de pregação, veio depois de várias atividades e preocupações com seus problemas pessoais. A liturgia procura focar sua atenção na adoração e no momento de culto congregacional, e, se atingir o objetivo, essa liturgia faz com que o ouvinte esteja preparado para ouvir a mensagem. Entretanto, se o pregador não mostra a ele que o que será pregado é de seu interesse, sua mente voltará a pensar em seus problemas e crises. A ideia, então, é prender a atenção do ouvinte; na linguagem de sala de aula, costumamos dizer que o objetivo da introdução é "fisgar" o ouvinte, assim como o pescador fisga o peixe: mesmo que queira fugir o peixe está firmemente ligado ao pescador. Quando o pregador faz uma boa introdução, o ouvinte fica curioso e ansioso por ouvir o que será exposto.

O segundo objetivo da Introdução é apresentar o tema da mensagem fazer com que o ouvinte compreenda que o assunto a ser pregado tem relevância para sua vida. Ora, se o pregador expoe uma introdução que mostre um assunto relevante, mas prega sobre outro assunto, o ouvinte se sentirá enganado. "Uma introdução que suscita interesse, mas não atrai a atenção sobre o tema, na verdade dá aos ouvintes uma falsa direção." Se na introdução o pregador resolve apresentar uma ilustração ou uma história, esta deve estar intimamente ligada com o que vai ser pregado. "A introdução de uma mensagem tem o importante papel de chamar a atenção do auditório para pensar sobre o tema que o pregador pretende abordar." Pode ser que esteja empolgado para despejar as informações cintilantes que descobriu durante as horas de preparo, mas isso não quer dizer que o auditório esteja ansioso esperando uma palavra viva de Deus. Assim, se o pregador tem uma excelente ilustração, mas que não tem nada lá que ver com o assunto do sermão, ele deve guardá para outra ocasião.

O terceiro objetivo da introdução é de monstrar interesse pelos ouvintes é o ponto que argumentamos no início deste capítulo. Aqui o pregador mostrará que não vai pregar porque é sua obrigação, mas porque tem a boa intenção de abençoar os ouvintes, trazendo-lhes a boa Palavra de Deus. Mostra que o pregador está em contato com o mundo do ouvinte, quer ajudar, está aberto às suas necessidades e quer usar a Bíblia como instrumento de Deus. A introdução do sermão é que faz o ouvinte se sentir como um amigo que chega à casa de outro. E isso traz a pré-disposição que para ouvir com atenção e receptividade o sermão que será pregado. "Logo no início do sermão, portanto, os ouvintes devem perceber que o pastor está lhes falando acerca deles mesmo. Ele faz uma pergunta, identifica um problema ou uma necessidade, revela um ponto vital de debate ou qual a passagem fala. A aplicação começa na introdução, não na conclusão."

O quarto objetivo da introdução é preparar para a proposição - a maioria dos livros de Homilética concorda que a introdução prepara o ouvinte para o corpo do sermão. Desta forma, a introdução deverá ser pertinente com a proposição (ou tema) do sermão, uma vez que ela é um resumo do conteúdo, do corpo do sermão. É por isso que até a terminologia usada deve ser a mesma, a fim de fazer a ligação entre o que apresentado na introdução e no tema do sermão. Não faça uma introdução com uma ilustração sobre uma criança que se perdeu para falar sobre "A Benção do Dizimo", São dois assuntos diferentes.

B. AS CARACTERÍSTICAS DAS INTRODUÇÕES - Uma boa introdução é vital para a compreensão da exposição bíblica. Para ser boa, a introdução deve ter as seguintes características:

Em primeiro lugar, a introdução deve ser interessante - é o momento de conquistar a atenção do ouvinte, e de ele resolver se quer ou não prestar atenção ao que o pregador tem a dizer. Normalmente, a introdução é feita com uma ilustração, uma história que fascina o ouvinte, conquista sua atenção, e traz um tema que o faça querer ouvir o sermão. Se a introdução for desinteressante, sem empolgação e irrelevante, o que o ouvinte vai pensar sobre o sermão? Nesse caso, seria melhor que não houvesse introdução para não atrapalhar o sermão. O certo, então, é que a introdução seja o ponto principal, o golpe inicial, a fisgada que vai manter o ouvinte preso ao pregador até a última palavra.

A segunda característica da introdução é que ela deve ter objetividade - em outras palavras, ela deve ter uma razão para existir e estar ali. A introdução precisa conduzir ao tema do sermão, sendo o chamariz para cativar o ouvinte. Certa vez, na aula de Prática de Pregação do seminário, um aluno apresentou uma introdução que não tinha nenhuma relação com o conteúdo do sermão. Isso estava tão evidente que ele mesmo argumentou: "vocês devem estar pensando: o que isso tem a ver com o texto? Na verdade, nem eu sei!". Apesar de gerar gargalhadas em todo o auditório, esse fato mostrou que o pregador não havia preparado corretamente a introdução do sermão.

A terceira característica da introdução é que ela deve ser breve - não pode ser uma antecipação de todo o sermão, nem um mini sermão à parte. O pregador precisa ter capacidade de sintetizar o que quer dizer, para não cansar, nem enrolar o ouvinte. Se a introdução não for direto ao ponto, ela deixa de ser interessante; portanto, é necessário selecionar bem o que será incluído e o que será excluído da introdução. Tudo aquilo que não tem relevância para o tema do sermão deve ser descartado. É boa a seguinte comparação: "Talvez pudéssemos comparar a introdução a uma pedrada, que em poucos segundos chama a atenção, causa impacto, quebra a vidraça, mostra o que há no interior do aposento e desaparece." Ninguém mais vê a pedra, mas todos ficam olhando para o aposento! Note que uma pedrada na vidraça tem o poder de acordar todos os que estiverem dormindo nas proximidades e fazer com que todos olhem na sua direção. Assim deve ser a introdução: tem de acordar os dorminhoco.

A quarta característica da introdução é que deve ser clara - ou seja, ter linguagem acessível ao ouvinte. Se o ouvinte tem que se esforçar para compreender a introdução, então o pregador não soube desenvolvê-la. Na introdução não se deve usar palavras desconhecidas, nem linha de raciocínio complicada. Uma ilustração que envolva a experiência de alguém numa montanha de neve talvez não seja a mais apropriada para ser usada num país tropical, como o nosso, onde possivelmente nenhum dos ouvintes conheça neve. Por outro lado, se a introdução trata de experiências comuns ao dia a dia de nossos ouvintes, então ele será conquistado com maior facilidade e terá maior predisposição em ouvir o sermão, Portanto, seja claro e use vocabulário acessível.

A quinta característica da introdução é que ela deve ser bem planejada - apesar de ser óbvio, é necessário ressaltar essa característica, porque muitos pregadores caem no erro de gastar tempo na exploração do texto e deixar a introdução para fazer de improviso na hora da exposição. No início, afirmamos que o pregador deve preparar a introdução por último, depois de elaborar o corpo do sermão, para saber como fazer uma introdução que seja impactante e que conduza ao tema e conteúdo do sermão. Por isso, em lugar de ser menos importante, na verdade ela precisa de atenção especial em virtude de abrir o sermão e ser o "cartão de apresentação" do pregador. Pela introdução, o subconsciente do ouvinte resolve se quer ou não ouvir o restante da exposição.

C. ELABORANDO A INTRODUÇÃO 
Estando claros os objetivos e as caracteristicas da introdução, é necessário abordar as estratégias para elaborar boas introduções para o sermão. Lembre-se de que, nesse ponto, o sermão já deve estar pronto, e na mente do pregador está todo o panorama geral do seu conteúdo. Assim que o pregador toma a palavra, ele faz uma saudação ao auditório, e essa NÃO É a introdução do sermão! Atenção neste ponto, porque essa saudação é uma forma de aproximação do ouvinte, necessária E eficiente, mas ainda não começou o sermão. Este começa depois da leitura do texto, e é pouco produtivo lançar a introdução antes da leitura. "O reconhecimento de que a introdução é uma preparação imediata para a proposição adverte os pregadores a evitar separar a introdução do corpo com a leitura da Escritura. Essa saudação inicial é ótima oportunidade para mostrar a todos que o pregador é cordial e está à vontade no púlpito. Alguns autores de Homilética sugerem que o pregador estabeleça com clareza o limite entre as demais partes do culto e a pregação, ou fazendo uma pausa silenciosa para que seja perceptível a mudança de atividade, ou usando um comentário acerca de algo que acabou de acontecer no decorrer do culto. O pregador poderia, por exemplo, fazer a seguinte saudação: - "Depois de um período tão abençoado de adoração, VOLTEMOS agora nossa atenção ao estudo da Palavra viva de Deus..." Ou ainda: "Obrigado ao Conjunto Coral por enlevar nosso espirito com tão lindos cânticos de adoração ao nosso Deus. Vamos abrir nossas Biblias..."
Ou, se a música versou sobre o tema da mensagem: - "Obrigado, José, por esta música especial. Deus tem falado muito ao meu coração com este cântico e gostaria, nessa noite, de compartilhar com os irmãos acerca disso..."

Aí vem a leitura do texto bíblico. Veja que a ideia é que o pregador precisa mostrar naturalidade ao dar sequência às partes do culto, demonstrando ter feito um trabalho em equipe com quem está conduzindo a liturgia. Depois da leitura bíblica é que vem a Introdução do sermão, que pode ser uma ou mais de uma das formas anotadas a seguir:

A Introdução pode ser um relato de algo do conhecimento do ouvinte uma breve descrição de algum evento ou história da experiência de alguém com quem os ouvintes são compelidos a identificar-se. "Se o relato é sério ou engraçado, se deriva da História ou da vizinhança, se procede de algo real onde pessoalmente experimentado, a incomparável capacidade dessas histórias de cativar a atenção e apontar aos interesses biblicos, faz delas formas fundamentais de introdução ao sermão". Um fato que aconteceu pode ser uma excelente introdução a um sermão. Na semana seguinte a um acidente aéreo com muitas vítimas fatais no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, quando todo o país estava impactado e consternado com aquela tragédia, um pregador iniciou o sermão com ar sério, e fez uma narrativa cronológica do acidente e de quantas pessoas morreram ali. Ele terminou sua introdução com a pergunta: "onde Deus estava naquele momento?", Depois de uma pausa silenciosa, ele continuou: "É sobre isso que meditaremos hoje na exposição deste texto!". Posso garantir que nunca tinha visto antes um auditório tão atento às palavras do sermão, porque o pregador não só tratou de um tema relevante e atual que incomodava o coração de cada ouvinte ali, como, também, caprichou na introdução do sermão.

A Introdução pode ser uma contundente declaração - que incomode ou espante o ouvinte. Duvido de que alguém deixe de prestar atenção em um sermão se o pregador introduzi-lo desta maneira: "Hoje quero falar acerca de uma fofoca que está matando nossa igreja e o que devemos fazer a este respeito" (quem sabe de alguma fofoca vai prestar atenção com medo de ter sido descoberto, e quem não sabe vai prestar atenção por curiosidade). Ou ainda esta: "Jay Adams oferece este espléndido exemplo: Há um criminoso assentado nessa congregação hoje... Estou falando sério. Ontem mesmo ele assassinou alguém. Julgou não ter sido visto por ninguém, mas estava enganado. Tenho uma declaração escrita por uma testemunha ocular, que vou ler. Aqui está o que ela diz: Todo aquele que odeia a seu irmão é um assassino' [1 Jo 3.15] " Só não se esqueça do que já estudamos: a introdução tem, obrigatoriamente, que conduzir ao tema. Cuidado para não falar sobre algo que não está de acordo com o que vai ser pregado no sermão. 

A Introdução pode ser uma pergunta ou frase provocativa - que desperte a atenção do ouvinte, fazendo-o pensar em algo que talvez nunca tivesse pensado antes. O exemplo de Haddon Robinson ilustra bem esse ponto, citando algumas perguntas sérias para mexer com os ouvintes: "Uma mulher que trabalha fora de casa pode ser boa mãe? O que você diz? E o que a Bíblia diz?". Com certeza esta pergunta estará incomodando muita gente: o marido cuja mulher trabalha fora quer saber da resposta a esta pergunta, tanto quanto a esposa que tem o seu emprego e vive com a consciência intranquila com a criação dos filhos. E mais: a mulher que não tem emprego fora de casa, mas tem grande necessidade de ajudar o marido no sustento do lar, também estará muitíssimo interessada nesse sermão. Até as jovens solteiras que estão estudando e se preparando para constituir sua própria família terão interesse nesse tipo de sermão; ou os filhos cujas mães têm emprego fora de casa. Veja que o tema é relevante e atual, mas o primeiro trabalho do pregador na hora da exposição é preparar uma introdução que "fisgue" a atenção de todos e lance a ideia.

A introdução do sermão pode ser, também, estatísticas contundentes - talvez algo que as pessoas nunca tenham pensado e que sirva para despertar o interesse naquele momento da exposição. Num sermão acerca da "Segurança do Crente", um pregador fez uma introdução mostrando um jornal, no qual constava uma estatística de que o Hospital de Urgência da cidade havia registrado o atendimento médio de 57 acidentes de motociclistas POR DIA! (a informação de que era diária foi muito bem destacada por ele). Fora os acidentes que não geraram atendimento médico ou que foram atendidos em outros hospitais. Ele leu na reportagem que vários acidentes foram com automóveis e ônibus, outros com pedestres que atravessavam a rua, outros por imprudência e imperícia do motociclista, foi citando. Obviamente, o pregador se certificou de atingir todas as pessoas do auditório, porque ou eram motociclistas, ou motoristas, ou pedestres (ainda falou sobre os pais que enviam seus filhos para a escola e não sabem se voltarão...). Na parte final de sua introdução, ele foi comentando esses dados, e encaminhando o argumento para a insegurança que todos temos no dia a dia. Então disse: "...E é sobre isso que fala o texto que vamos estudar hoje". Você pensa que alguém deixou de prestar atenção à mensagem? e assim, A introdução do sermão pode ser a citação de uma poesia - desde que se tenha o cuidado de lembrar que está no púlpito, e, portanto, não pode ser qualquer poesia, esse tipo de literatura é muito boa para conquistar a atenção do ouvinte. Cito como exemplo um sermão que ouvi há muito tempo, quando o pregador começou com uma poesia de Gióia Júnior intitulada "Nada era Dele". O pregador leu o texto e, depois de orar, solicitou a atenção do ouvinte para a seguinte poesia:

Disse um poeta um dia, fazendo referência ao Mestre amado:

"O berço que Ele usou na estrebaria, por acaso era dEle? - Era emprestado!

E o manso jumentinho, em que, em Jerusalém, chegou montado e palmas recebeu pelo caminho, por acaso era dEle?

Era emprestado!

E o pão - o suave pão que foi por seu amor multiplicado alimentando toda a multidão, por acaso era dEle?

 Era emprestado!

E os peixes que comeu junto ao lago e ficou alimentado, esse prato era seu? 

Era emprestado!

E o famoso barquinho? aquele barco em que ficou sentado, mostrando à multidão qual o caminho, por acaso era dEle? 

Era emprestado!

E o quarto em que ceou ao lado dos discipulos, ao lado de Judas, que o traiu, de Pedro, que o negou, por acaso era dEle? 

Era emprestado!

E o berço tumular, que, depois do Calvário, foi usado e de onde havia de ressuscitar, o túmulo era dEle?

 Era emprestado!

Enfim, NADA era dEle!

Mas a coroa que ele usou na cruz e a cruz que carregou e onde morreu, essas eram, de fato, de Jesus!" Isso disse um poeta, certo dia, numa hora de busca da verdade; mas não aceito essa filosofia que contraria a própria realidade...
O berço, o jumentinho e o suave pão,
os peixes, o barquinho, o quarto e a sepultura, eram dEle a partir da criação, "Ele os criou" - assim diz a Escritura...
Mas a cruz que Ele usou - a rude cruz, a cruz negra e mesquinha onde meus crimes todos expiou, essa não era Sua,
ESSA CRUZ ERA MINHA! Aquela poesia expressava exatamente o tema do sermão daquele dia, que traballhou a ideia de tomou sobre si as nossas "dores". Naquela ocasião o pregador preparou o ouvinte, mostrando com uma poesia que o assunto do sermão tinha relevância. que Ele E o que dizer da poesia secular? Quando falamos disso, temos que ressaltar o cuidado que o pregador deve ter na escolha de tal poesia. Pode ser usada, desde que com muito critério. Na verdade, o apóstolo Paulo usou de poesia secular em um de seus sermões (At 17.27), mas não deve o pregador exagerar no uso de tais literaturas. Deixe-me citar um exemplo de uso de poesia secular. Ouvi um pregador que fez a introdução de um sermão sobre "O Lar Celestial" usando o poema "Canção do Exílio" de Gonçalves Dias, falando dessa forma: "Um poeta escreveu certa vez a seguinte poesia:

Minha terra tem palmeiras,

Onde canta o Sabiá; As aves, que aqui gorjeiam, Não gorjeiam como lá.

Nosso céu tem mais estrelas, Nossas várzeas têm mais flores, Nossos bosques têm mais vida, Nossa vida mais amores.

Em cismar, sozinho, à noite, Mais prazer encontro eu lá; Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá.

Minha terra tem primores, Que tais não encontro eu cá; Em cismar sozinho, à noite Mais prazer encontro eu lá; Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá.

Não permita Deus que eu morra, Sem Sem que eu volte que para lá; desfrute os primores Que não encontro por cá; Sem qu'inda aviste as palmeiras, Onde canta o Sabiá".

E a partir dali ele continuou sua introdução, mostrando que o poeta expressava a saudade daqueles que estão fora de sua pátria, e passou a ligar essa saudade com o texto que afirma que somos peregrinos e que temos um lar celestial. É claro que todos nós, que estávamos no auditório, sabíamos que se tratava de uma poesia secular que aprendemos na escola e com aquela poesia ele tinha arrebatado nossa atenção, porque todos nós ficamos pensando sobre onde ele queria chegar, usando uma poesia secular. Novamente é necessário afirmar aqui o princípio do bom senso do pregador, e aconselhar que se busque outro tipo de poesia para a introdução, uma vez que há um grande risco de provocar escândalo nos ouvintes, principalmente aqueles de mais idade.

A introdução do sermão pode ser, ainda, citações de eventos históricos ou contemporâneos, que sirvam para ilustrar o tema do sermão. O pregador pode evocar fatos históricos conhecidos do auditório, como a independência do Brasil ("Independência ou Morte!"), o dia do Fico ("...digam ao povo que fico!"), eventos e relatos da segunda guerra mundial, e milhares de outros fatos. Mas, neste, ponto, deixo dois alertas: primeiro, verifique a exatidão da informação histórica. Lembre-se de que no auditório poderá haver uma pessoa (um professor de História, por exemplo) que tem conhecimento minucioso da informação. Isso me aconteceu certa vez quando citei, na introdução de um sermão, a narrativa de um evento envolvendo Alexandre, o Grande. Afirmei na ilustração que ele era "general macedônio" e, no final do culto, um professor universitário cumprimentou-me e disse: "boa informação, pastor, porque a questão que os alunos mais erram no vestibular é a afirmação de que Alexandre era Grego". Fiquei aliviado por ter gasto um pouco mais de tempo na pesquisa histórica. Apesar de ser uma questão irrelevante (Macedônio ou Grego), naquele momento eu poderia ter perdido um ouvinte por citar uma informação histórica errada. Aliás, o pregador deve tomar muito cuidado com as informações retiradas da internet, porque nem sempre são confiáveis. O segundo alerta é: jamais emita juízo de valor sobre os acontecimentos citados. Principalmente se for um evento dos dias atuais, uma notícia da semana. Não mostre sua opinião sobre os personagens e eventos. Você pode achar um determinado político corrupto, mas, como você não pode provar isso, não faça essa afirmação no púlpito; mesmo porque pode haver no auditório um parente ou amigo do tal político, e esse será um ouvinte que você perderá pelo simples fato de ter emitido uma opinião. Além disso, não compete a você usar do precioso tempo de exposição da Bíblia para alimentar discussões ou julgar quem quer que seja.
Enfim, a introdução do sermão pode ser feita utilizando-se de diversas estratégias. O conselho dos pregadores mais experientes é que nada funciona o tempo todo. Por isso, o pregador deve sempre diversificar, semana após semana.

A introdução, portanto, é a parte do sermão que acontece depois da leitura do texto e da oração, e antes do lançamento do Tema do sermão. "Jay Adams oferece este conselho severo: Não comece com o texto; comece com a congregação, como faziam Pedro e Paulo. Retorne à passagem da Escritura só quando tiver orientado adequadamente sua congregação para o que eles ali encontrarão, e só quando você tiver despertado interesse suficiente para que queiram saber do que se trata" Como já foi colocado, a introdução tem o objetivo de "fisgar" o ouvinte. Agora é a hora de jogar o ouvinte "dentro" do texto. Veja que a introdução tem um caráter de contato com o ouvinte, e, por isso, não trata do texto lido, mas de alguma ilustração interessante que capta a atenção. Entretanto, agora é preciso aproveitar essa atenção e passar a mostrar os detalhes do texto. Essa é a função da Narração.

A NARRAÇÃO DO SERMÃO 
A narração do sermão é a parte na qual o pregador prepara o ouvinte para compreender o texto. A introdução conquistou a atenção e conduziu o ouvinte para o tema. Agora, o pregador vai passar para o ouvinte todas as informações necessárias para a compreensão do texto. Preste atenção na parte em itálico: diz respeito às informações necessárias. Durante a pesquisa e estudo do texto, o pregador obteve um número enorme de informações sobre o seu conteúdo, sobre o tema, sobre os aspectos históricos, culturais e geográficos que envolviam os eventos da passagem. O que será repassado para o sermão serão apenas as informações estritamente necessárias para a compreensão do texto. Num sermão que ouvi recentemente, o pregador gastou boa parte do seu tempo explicando que, na cultura dos tempos bíblicos, a palavra "carpinteiro" era frequentemente usada para se referir a quem trabalhava com construção, podendo significar também "pedreiro". Ora, essa informação não contribuiu absolutamente com nada para o sermão que falava sobre as "acusações injustas que caíram sobre Jesus". Era, portanto, irrelevante transmitir este conhecimento, pois algum ouvinte poderia ficar pensando nisso durante a exposição do sermão, o que desviaria o foco de sua atenção.

A narração precisa ser bem elaborada principalmente no que se refere a selecionar o que será incluído. Vamos trabalhar em um exemplo. Caso o pregador esteja preparando um sermão sobre o encontro de Zaqueu com Jesus (Lucas 19.1-10), existem algumas palavras que precisam de explicação específica para se compreender o texto: como era a cidade de Jericó? Qual a sua distância de Jerusalém? que era um publicano? E o maioral dos publicanos? O que era um sicômoro? Qual era o tamanho dessa árvore? Por que ele se dispôs a restituir quatro vezes mais? O que dizia a lei da restituição?

Veja que essas informações não precisam fazer do corpo do Sermão, mas precisam ser esclarecidas parte para que o ouvinte possa compreender o texto. A narração segue as mesmas orientações da introdução, ou seja: tem que ser breve, objetiva, completa e direcionar para o tema. Ela é inserida entre a introdução e o tema, com a finalidade de estabelecer o "pano de fundo" para entender o texto. Um sermão sobre o texto de Zaqueu poderia ser como o exemplo que se segue (a pregação em si é o que está na coluna da direita):

sábado, 4 de setembro de 2021

(Capítulo 6) AS DIVISÕES E AS DISCUSSÕES DO SERMÃO...

Depois de feitas as pesquisas relatadas na primeira parte deste trabalho (Hermenêutica e Exegese) e definido com clareza o tema, chegou a hora de elaborar o corpo do sermão. Essa etapa é semelhante a um grande bolo de aniversário: não dá pra comê-lo inteiro, razão pela qual o repartimos em fatias. Assim é o corpo do sermão: existe muito conteúdo, e este precisa ser "fatiado" e servido parte a parte, à medida que o ouvinte vai "mastigando" e se alimentando da verdade viva da Palavra de Deus.

Vamos, então, aprender passo-a-passo como montar a estrutura do sermão, a começar pelo Tema e pelas Divisões. Para facilitar, vamos supor que temos que fazer um sermão tendo como texto o Salmo 23. Vamos relembrar esse magnífico texto? Antes de falar da Estrutura do Sermão como vimos no primeiro módulo (princípios de Hermenêutica e Exegese), é muito importante ler o texto atenciosamente. Por isso, leia agora o Salmo 23:

¹O SENHOR é meu pastor; nada me faltará. ²Ele me faz repousar em pastos verdejantes. Leva-me para junto das águas de descanso; ³refrigera-me a alma.
Guia-me pelas veredas da justiça por amor do seu nome. *Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal nenhum, porque tu estás comigo; o teu bordão e o teu cajado me consolam. Preparas-me uma mesa na presença dos meus adversários, unges-me a cabeça com óleo; o meu cálice transborda.
"Bondade e misericórdia certamente me seguirão todos os dias da minha vida; e habitarei na casa do SENHOR para todo o sempre.

Leu com atenção? Ótimo! Então, sua tarefa é pesquisar tudo que estiver ao seu alcance sobre esse texto. Comece destacando as palavras cujo significado você desconheça. Anote num caderno e procure num dicionário cada uma delas. Depois, pense no contexto: analise o que um pastor de ovelhas fazia naquela época e como ele pastoreava. Por que essas informações? Porque Davi escreveu o salmo pensando em como ele pastoreava as suas ovelhas, chegando à conclusão de que Deus cuidava dele do mesmo jeito que Davi cuidava de suas ovelhas. Por isso, se entendermos o que Davi tinha em mente sobre o cuidado que tinha com suas ovelhas, poderemos entender o que ele quis dizer no salmo.

Busque em livros, ou na internet, todas as informações que puder sobre criação de ovelhas, e como os pastores fazem para cuidar delas. Veja, por exemplo, algumas informações sobre as ovelhas que podem ser encontradas numa pesquisa rápida:

1. Ovelhas são animais que não enxergam longe; caso se afastem do rebanho, perdem-se facilmente, porque não conseguem enxergar nem o pastor, nem as demais ovelhas;

 2. Ovelhas têm lã muito espessa, que esquenta muito. Por isso, elas precisam se "refrescar" na água. Carecem de sombra e água fresca;

3. Ovelhas têm as pernas muito curtas; se entrarem num rio com correnteza, o que acontece? A lã da sua barriga se encharca e a correnteza a leva. Por isso, o pastor tem sempre a preocupação de levar suas ovelhas para águas tranquilas.

E aí? Começou a perceber o quanto é importante entender o contexto e as informações do texto? O que Davi quer dizer é que nós somos como as ovelhas: enxergamos muito pouco o futuro, precisamos de refrigério pra nossa alma, e somos sujeitos a muitos perigos constantemente. E mais ainda: assim como Davi compreendia as necessidades e características de suas ovelhas, Deus também conhece nossas necessidades e características e cuida de nós com o mesmo empenho que Davi cuidava das suas ovelhas. E isso já pode ser o início do "conteúdo" do seu sermão no salmo 23. E olha que eu citei apenas três informações sobre ovelhas! Imagine quando você fizer uma pesquisa completa em livros, revistas, dicionários bíblicos e na internet!

Então, esta é a primeira parte: analisar e estudar o texto cuidadosamente. Isso nos fornecerá um monte de informações que ainda não são o sermão, uma vez que estão desconectadas umas das outras. Falta o quê? ESTRUTURA. Por isso, deixe de lado suas anotações sobre o texto e vamos pensar na Estrutura do Sermão.

Voltaremos a falar do Salmo 23 daqui a pouco. Quando falamos de Estrutura, aprendemos que ela é o "esqueleto" do sermão; um "esboço" que mantém o conteúdo do sermão em pé. Existem várias partes que compõem a Estrutura do sermão, e vamos estudar uma por uma cuidadosamente. Agora, vamos concentrar nossa atenção no tema e nas divisões, que formam o "corpo" do sermão. Para facilitar nosso exemplo, planejaremos um sermão de três divisões. Vamos, então, pensar num tema. Lembra-se das conclusões a que chegamos quando analisamos as informações sobre ovelhas? O que podemos aprender com o salmo? Que o Senhor cuida de mim como Davi cuidava de suas ovelhas, pois o Senhor é o meu pastor. Esse será o tema do Sermão! Então, vamos iniciar a elaboração da nossa estrutura:

TEMA: O senhor é meu pastor 

1ª Divisão: 
2² Divisão:
3ª Divisão:

Agora que já temos o tema, vamos pensar nas divisões. Imagine que todo o conteúdo que você pesquisou e quer colocar no sermão seja um grande "bolo de aniversário". Ninguém come um bolo grande com uma só mordida. Por isso, a gente corta o bolo e vai comendo fatia por fatia. Assim é o conteúdo do sermão: precisa ser dividido. Vamos fazer essa divisão pela sequência lógica do texto: versos 2-3, v. 4 e v. 5-6. São os três "blocos" do salmo 23. Cada "bloco" será uma divisão de nosso exemplo. Comecemos, então, pelo bloco 1: nos versos 2 e 3, Davi fala que Deus cuida dele, fazendo-o repousar, guiando-o, etc. Assim, vamos elaborar a primeira divisão pensando no tema e nessa ação de Deus - Ele traz direção:

TEMA: O Senhor é o meu Pastor

1ª Divisão: Ele traz Direção à minha Vida
2ª Divisão:
3a Divisão:

Agora, passamos para o 2º bloco, que está no verso 4. Ali o salmista afirma que, mesmo que eu passe por momentos difíceis, Deus me traz descanso. A ideia, então, é a de que eu posso descansar na vontade de nosso pastor celestial, pois Ele cuida de mim. Esta é a segunda "fatia do bolo", ou seja, a 2ª divisão do sermão:

TEMA: O Senhor é o meu Pastor

1ª Divisão: Ele traz Direção à minha Vida
2ª Divisão: Ele traz Descanso à minha Vida
3ª Divisão:

E, finalmente, o 3º Bloco, versos 5-6, quais falam que se os inimigos chegarem, o Senhor me traz Segurança. Essa é a 3ª "fatia", ou seja, a 3ª divisão do sermão:

TEMA: O Senhor é o meu Pastor

1ª Divisão: Ele traz Direção à minha Vida
2ª Divisão: Ele traz Descanso à minha Vida
3ª Divisão: Ele traz Segurança à minha Vida

Pronto. Agora já temos uma Estrutura do Sermão. Veja que esse é apenas o "esqueleto". Ele precisa ser preenchido com as informações que já obtivemos no início do estudo do texto. Essa parte, a Estrutura, é a mais difícil na "montagem" do sermão. Por isso, fixe bem essa metodologia para elaborar uma boa estrutura; mais à frente falaremos sobre o "enchimento" dela, que é identificado como "discussão". Por enquanto, precisamos continuar com nossa atenção na estrutura, a fim de melhorar nossa capacidade de olhar de forma sistemática para o sermão.

Deixe-me mostrar rapidamente outro exemplo de como elaborar o Tema e as Divisões do sermão, usando um texto mais extenso e do Novo Testamento. Este é o texto de Mateus 6.25-34, no qual Jesus fala da "ansiosa solicitude pela vida". Abra sua Bíblia e leia este texto cuidadosamente.

Antes de tudo, perceba que toda vez que a primeira letra de um versículo aparece em "negrito", isso indica que, no original, ali se inicia um parágrafo. Portanto, neste texto temos dois parágrafos: v. 25 e v. 34. Aqui, partimos do pressuposto de que você já pesquisou as palavras das quais não sabia o significado, analisou o contexto do texto, onde Jesus estava, para quem estava falando, o que ele tinha por perto para usar no ensino, entre outras coisas, e aplicou as leis da Hermenêutica e Exegese estudadas no módulo 1.

Vou colocar uma cópia do texto pra você perceber como visualizar os diagramas contidos na narração e o quanto é importante ter um olhar sistemático para o texto:

Entendendo o Texto:

Lição Principal - 25 Por isso, vos digo: não andeis ansiosos pela vossa vida, quanto ao que haveis de comer ou beber; nem pelo vosso corpo, quanto ao que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o alimento, e o corpo, mais do que as vestes?

Primeira ilustração (as aves do céu) - 26 Observai as aves do céu: não semeiam, não colhem, nem ajuntam em celeiros; contudo, vosso Pai celeste as sustenta. Porventura, não valeis vós muito mais do que as aves? 27 Qual de vós, por ansioso que esteja, pode acrescentar um côvado ao curso da sua vida?

Sugunda ilustração (os lírios do campo) - 28 E por que andais ansiosos quanto ao vestuário? Considerai como crescem os lírios do campo: eles não trabalham, nem fiam. 29 Eu, contudo, vos afirmo que nem Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer deles. 30 Ora, se Deus veste assim a erva do campo, que hoje existe e amanhã é lançada no forno, quanto mais a vós outros, homens de pequena fé? 
Conclusão do parágrafo (primeiro "portanto", sem negrito, fechando o parágrafo) - 31 Portanto, não vos inquieteis, dizendo: Que comeremos? Que beberemos? Ou: Com que nos vestiremos? 32 Porque os gentios é que procuram todas estas coisas; pois vosso Pai celeste sabe que necessitais de todas clas;
33 buscai, pois, em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas.

Conclusão final - 34 Portanto, não vos inquieteis com o dia de amanhã, pois o amanhã trará os seus cuidados; basta ao dia o seu próprio mal.

Agora, vamos à primeira ação homilética: separar o texto por "blocos", a fim de compreender quais são as "fatias do bolo", e captar a mensagem "total" do texto. Vá fazendo uma análise pelo conteúdo de cada versículo ou bloco de versículos, e perceba que temos um esquema do texto assim:

1. Ensino principal (v25) 
1.1 ilustração (V. 26-27)
1.2 ilustração (V. 28-30)

Conclusão preliminar (v.31-33)
Conclusão final (V. 34)

Nosso sermão, então, ficará assim (analise o esboço abaixo):

TEMA: Evitando a ansiedade com as coisas materiais

1. Porque a Vida é mais do que o Alimento
(v.26-27)

2. Porque o Corpo é mais do que as Vestes (v. 28-30)

3. Porque os Gentios é que se preocupam com as coisas materiais (v. 30-33)

Pois bem. Veja que este esboço é o "esqueleto" do sermão, que dá sustentação aos ensinos que serão inseridos em cada uma das divisões. Sem esse "esqueleto", o sermão não tem consistência e nem poderá ser absorvido pelo ouvinte.

Por isso, algumas características das divisões 20 precisam ser observadas.

As divisões devem ser reduzidas em número - a primeira pergunta que surge nessa parte é: quantas divisões devem ter o sermão? A resposta é: tantas quantas o texto exigir. Entretanto, vamos lembrar de que o bom senso vai ajudar o pregador a manter o equilíbrio de tal forma que, se o texto só apresenta uma divisão, ele precisa trabalhar mais para "fatiar o bolo"; por outro lado, se o texto traz oito divisões, o bom senso diz para o pregador preparar dois sermões em lugar de um só, porque, senão, o sermão corre o risco de ter muito conteúdo numa só exposição. O conselho é: "Não sobrecarreguem o sermão com material demais. Não se deve tentar comprimir a verdade toda num discurso"21. Há uma teoria de que o sermão precisa ter três divisões, com base em estudos que afirmam que esse é o número ideal para a fixação do conteúdo na mente humana. Entretanto, voltamos à questão do bom senso, uma vez que, de
fato, o ouvinte não vai conseguir se lembrar de muitas ele evite pregar divisões. Caso o pregador tenha a responsabilidade de pregar na Igreja o ano todo, convém que sermões com excessivo número de divisões, uma vez que ele pode continuar a exposição do texto no sermão da semana seguinte. Só deve ter o cuidado de elaborar sermões independentes, cada um com começo, meio e fim, de acordo com os princípios da homilética.

As divisões devem ser distintas, o pregador deve tomar cuidado para não ser repetitivo na organização das divisões. "As divisões principais da exposição devem ser concisas e claras. Cada uma deve ser autônoma, isto é, deve ter sua série de argumentos sem infringir a outra"22.

Quando mudar de uma divisão para outra, zele para que também mude o assunto, passando para um que seja sequência do anterior. Lembre-se de que, além de mudar de assunto, é necessário haver sequência de raciocínio na organização das divisões de tal forma que uma complemente a outra ao mesmo tempo em que complementada pela seguinte. E
As divisões devem ter Unidade, ou seja, estar intimamente ligadas ao tema - na verdade, cada divisão deve ser uma continuação do tema e manter a harmonia com a divisão anterior e posterior. Para testar a unidade entre o tema e as divisões, faça o seguinte: leia o tema e leia a primeira divisão do sermão. Parece algo lógico? Foi no sistema de uma pergunta e uma resposta? Qualquer pessoa que ler essas duas frases compreende sem maiores esforços? Isso ocorre com o tema e as demais divisões? Se a resposta for positiva, então ficou bem elaborada a estrutura.

Estrutura do Sermão

TEMA.
1° Argumento
2º Argumento 
3º Argumento
4° Argumento
Conclusão

Vamos ilustrar isso com o exemplo que usamos, o do Salmo 23. Um sermão naquele texto, como vimos, poderia manter como tema o próprio começo do salmo: "O Senhor é meu Pastor". As divisões, então, teriam que emanar do tema, completando-o e explicando-o.

Tema: "O Senhor é meu Pastor" (Salmo 23)
1.1 Ele traz Direção à minha vida (v. 2-3)
1.2 Ele traz Descanso à minha vida (v.4)
1.3 Ele traz Segurança à minha vida (v.4-6)

Dessa forma, se alguém ler o tema e ler a primeira divisão, verá que eles se completam ("O Senhor é meu Pastor: Ele traz Direção à minha Vida"); o mesmo acontece com as demais divisões. Caso a leitura das duas frases (tema e divisão) não se completem, então o pregador deve reiniciar seu trabalho e elabora-las novamente.

As divisões devem ter padrão didático - isso quer dizer que cada uma delas deve ter uma mesma forma de ser expressa, obedecendo ao padrão que for estabelecido. Por exemplo, se a primeira divisão estiver no passado, as demais também devem estar no passado:

Tema: "Deus ouve as Orações"

1.1 Ele ouviu as orações de José
1.2 Ele ouviu as orações de Ana
1.3 Ele ouviu as orações de Daniel

Veja que, no nosso exemplo do Salmo 23, todas as divisões começam ("Ele traz") e terminam ("à minha Vida") com as mesmas palavras e as ações expressas no meio de cada divisão (Direção, Descanso e Segurança.) Consequência tanto do tema quanto da argumentação anterior:

TEMA: O Senhor é o meu Pastor

PADRÃO 
DIDÁTICO... 

1. Ele traz - Direção - à minha Vida  
2. Ele traz - Descanso - à minha Vida 
3. Ele traz - Segurança - à minha Vida 

Esse padrão didático facilita a "digestão" da mensagem, e faz com que o ouvinte compreenda mais rapidamente o conteúdo do sermão. Além disso, o padrão didático facilita a vida do pregador, visto que, se ele quiser fazer a apresentação do sermão sem esboço, terá que decorar só as palavras no meio das frases, uma vez que o início e fim das divisões são todos iguais.

As divisões devem ser apresentadas por frases curtas e de fácil compreensão - assim como o tema não deve ser muito comprido, as divisões precisam ser breves e objetivas, a fim de facilitar a compreensão e a memorização. "Ao compor as divisões principais, é necessário que o expositor se lembre da situação do ouvinte. Normalmente, eles não podem ver o esboço do sermão. Portanto, é importante que as divisões principais sejam redigidas com frases ou declarações curtas e de fácil memorização". Quando o pregador insere nas divisões frases muito longas, a impressão que o ouvinte tem é de que há um sermão dentro do sermão. "O esboço do sermão deve também ser 'visível' ao ouvinte, isto é, a redação de cada divisão deve ser curta e fácil de memorizar. Palavras que produzam imagens mentais são imprescindíveis a um esboço que possa ser memorizado."

Antes de concluir essas características das divisões, insisto que este trabalho deve ser feito depois de exaustiva pesquisa e estudo do texto. Lembro isso aqui porque há um risco enorme de o sermão ter um bom tema, divisões bem elaboradas, mas ser completamente desprovido de conteúdo. "Dividir bem um sermão pode ser uma arte muito útil, mas, como fazê-lo se não houver nada para dividir? [...] O verdadeiro ministro de Cristo sabe que o verdadeiro valor de um sermão está, não em seu molde ou modo, mas na verdade que ele contém." Esse ponto de equilíbrio é importante para que, aliada à capacidade técnica de elaborar um bom sermão, esteja a fidelidade ao conteúdo bíblico do texto que estamos expondo. É por essa razão que vários professores de Homilética insistem que no ministério da pregação não há lugar para preguiçosos. A responsabilidade de quem prega a palavra é muito grande para ser encarada como atividade a ser feita no pouco tempo que sobra em nossa agenda. Ou priorizamos o estudo da Palavra com seriedade, ou deixamos tal ministério para outra pessoa que se esmere mais.

As divisões (ou argumentações) do sermão, então, constituem-se na forma de apresentar o conteúdo principal do sermão. Precisam ser bem elaboradas justamente porque esse conteúdo geralmente é amplo e de difícil compreensão, a menos que o pregador ache a metodologia correta para expor passo a passo, ponto a ponto, dando tempo e possibilitando ao ouvinte o entendimento e a montagem do quebra-cabeças" em sua mente.

Tendo caprichado na definição do Tema e das Divisões, agora chegou a hora de preencher as divisões com o conteúdo do sermão. Essa parte, nos livros de homilética, é chamada de "Discussão".

A Discussão

"As divisões principais e as subdivisões não passam do esqueleto do sermão e servem para indicar as linhas de pensamento a serem seguidas ao apresentá-lo. A discussão é o desdobramento das ideias contidas nas divisões."
Na discussão é que o pregador vai incluir todo o material de pesquisa para esclarecer o texto bíblico. É pegar a estrutura e expandir as divisões, explicando tudo que for necessário. Algumas informações são colocadas na Narração, que é a parte do sermão disposta antes do Tema e das Divisões. As informações resultantes da pesquisa que entrarão na discussão são aquelas que vêm explicar a respectiva divisão. Por isso, no próximo capítulo faremos diferenciação entre essas duas formas de inserir as informações. Por enquanto, lembre-se de que, após lançar cada divisão, o pregador vai usar a discussão para explicar cada uma das divisões. Veja onde ficará a discussão no desenho abaixo:

TEMA: O Senhor é o meu Pastor 

1. Ele traz Direção à minha Vida
Aqui vem a discussão: é a explicação da
primeira divisão.

2. Ele traz Descanso à minha Vida
Aqui vem a discussão: é a explicação da segunda divisão. 

3. Ele traz Segurança à minha Vida
Aqui vem a discussão: é a explicação da
terceira divisão.

A discussão, portanto, é o conteúdo bíblico teológico que o pregador irá expor dentro de cada divisão do sermão. Para fazer esse trabalho com eficiência, James Braga alista as seguintes qualidades para a discussão:

1. A discussão deve ter Unidade - assim como a divisão deve ter unidade com o tema, a discussão deve ter unidade com a divisão, uma vez que ela é a explicação da divisão. Você não pode anunciar uma coisa na divisão e falar de outra coisa ao explicá-la.

2. A discussão deve ter Proporção - dependendo do ambiente e do auditório, ou mesmo do contexto em que a pregação está sendo feita, o pregador deverá ter sensibilidade para reconhecer quais partes do sermão precisarão de mais ênfase ou de um tratamento mais completo. As divisões devem ser bem equilibradas, a fim de apresentar um sermão mais completo. Você deve evitar, por exemplo, usar 20 minutos para explicar a primeira divisão e apenas três minutos para explicar a segunda, pois seu sermão ficaria desproporcional.

3. A discussão deve ter Progressão - as ideias de cada divisão devem ser claras e sequenciais, estabelecidas de tal forma que o ouvinte possa "caminhar junto" com o pregador.

4. A discussão deve ter Brevidade - uma das falhas mais comuns do pregador é a verbosidade. Na maioria das vezes, o que é dito em 45 minutos pode ser dito em 25. O resultado é que ouvinte cansa e perde o interesse na pregação. Por isso os pregadores devem desenvolver disciplina pessoal para saber "falar pouco e dizer tudo".

5. A discussão deve ter Clareza - fica aqui o alerta para o uso de palavras complicadas, que não fazem parte do cotidiano do ouvinte. Já falamos sobre isso ao tratar do Tema do sermão, e agora repito o alerta nesta parte também. Já pensou o quanto deve ser dificil ouvir um pregador que diz: "Porque o deslavo peremptório da abruptividade humana é uma realidade antropomórfica que extrapola os parâmetros da sanidade psicossomática do ser hodierno". Entendeu alguma coisa? (nem eu...). Pois então preste atenção para não falar algo semelhante na pregação. Não adianta o pregador entender. Quem tem que entender é o ouvinte.

Vamos explicar um pouco mais sobre a discussão no próximo capítulo, ao usar outro exemplo de sermão.
... 

sexta-feira, 3 de setembro de 2021

(Capítulo 5) O TEMA (OU PROPOSIÇÃO) DO SERMÃO...

Um leitor mais atento vai perceber que, neste estudo, estamos simplificando o uso dos termos "Título", "Assunto", "Tema" e "Proposição", que são partes distintas, e colocando tudo apenas como "Tema". Isso é intencional. Optamos por essa simplificação porque, em nossas aulas de Homilética, os alunos sempre tiveram dificuldades em aplicar esses conceitos na preparação do sermão. E complicavam-se tanto tentando fazer todas essas partes, que perdiam o foco principal do texto. Por isso, vamos definir o "Tema" ou "Proposição" como sendo "uma declaração simples do assunto que o pregador se propõe apresentar, desenvolver, provar ou explicar. É o sermão inteiro numa só frase que expresse a totalidade do ensino que será ministrado. John Henry Jowett expressou a importância da definição do tema de forma enfática: "Estou convicto de que nenhum sermão está pronto para ser pregado, nem pronto para ser publicado, enquanto não nos for possível expressar o seu tema numa breve e fecunda sentença, tão clara como o cristal". Quando o pregador conseguir chegar a uma proposição, ele estará, desta maneira, pronto para preparar o sermão.

Ao colocar a "proposição" como sinônimo de "tema" (apesar de tecnicamente serem distintos), a intenção é enfatizar que o tema deve ser uma "proposta" sobre a qual o sermão vai discorrer. Por isso, é ele que mostrará claramente a direção que o sermão vai tomar, e delimitará os caminhos que não serão abordados na exposição, Outra necessidade de um trabalho árduo na elaboração do tema é que este trabalho preserva a unidade do sermão, não permitindo que o pregador fique divagando sem rumo. Desta forma, o tema já aponta para a conclusão e ajuda a manter uma "linha reta" sem desvíos até que se chegue lá. Muitos sermões não são bem elaborados pela simples falta de definição clara do tema,

Para que o tema seja esse referencial do sermão inteiro, ele precisa ser elaborado levando em consideração alguns princípios que auxiliarão o pregador.

Primeiramente, o tema deve ter uma única ideia principal, porque, senão, corre-se o risco de destruir a unidade do sermão inteiro. Jamais um tema deve lançar duas ideias ao mesmo tempo. "O tema, objetivo, ou foco do escritor biblico, deve prender nossas mensagens e colocá-las ao seu serviço, pois a verdade de Deus controla nossos esforços. [...] Apesar de muitas ideias e características comporem um sermão, todas elas devem contribuir para um tema. Cada sermão possui apenas um tema"

Em segundo lugar, o tema deve ser o mais breve possivel, para facilitar a memorização. É lógico que ninguém conseguiria se lembrar de um sermão cujo tema seja: "As caracteristicas pessoais marcantes daqueles que foram comprados pelo precioso sangue do Cordeiro e têm garantia da habitação celestial na perspectiva escatológica do cumprimento do final dos tempos": por outro lado, se o sermão for sobre "As Caracteristicas do Homem de Deus", certamente o ouvinte guardará na mente. Convém fazer uma ampliação do conceito de brevidade do tema, porque nem sempre o menor número de palavras é o melhor para um tema. Por exemplo: se o tema for apenas "Igreja", poderia ser um bom tema por ter uma só palavra, mas essa única palavra expressa uma grande variedade de conceitos. Por isso, o ideal seria especificar no tema qual desses conceitos será abordado naquele sermão. Assim, se o sermão for sobre "Os Perigos da Igreja", o tema já dispensa dezenas de conceitos e fixa o sermão em apenas um deles.

O terceiro princípio que deve ser observado na elaboração do tema é que ele deve estar intimamente ligado ao texto. Se o texto for aquele do filho pródigo (Lc 15.11-32) por exemplo, o pregador pode optar por abordar a atitude do filho mais jovem ("O Filho Rebelde") ou a atitude do Pai ("Recebendo o Filho Pecador"), ou ainda a atitude do filho mais velho ("Vivendo sem Liberdade na Casa do Pal'). Perceba que, dentro de um mesmo texto, podemos ter vários temas de sermões, mas cada um deles precisa estar ligado diretamente ao texto da exposição bíblica.

O quarto princípio é que o tema tem que ser interessante e atual. Deve ser relevante para despertar o interesse e a curiosidade do ouvinte, a fim de captar sua atenção e direcioná-lo para alguma área prática na sua vida diária. Se o sermão no texto de Mateus 4.1-11 (A tentação de Jesus) tiver como tema "As tentações do Filho de Deus", talvez seja de pouco interesse para quem está ouvindo. Mas se o mesmo sermão tiver o tema "Como Vencer as Tentações", certamente vai ser mais atrativo e interessante, uma vez que trata de assunto que incomoda a todo cristão.

Por fim, convém lembrar de James Braga, quando adverte que o tema deve estar de acordo com a dignidade do púlpito". Ele alerta para o perigo de o pregador usar temas rudes ou irrelevantes (por exemplo: "As Barbas do Gato" ou "O Grande Maricas").

Portanto, lembre-se de que o tema deve expressar claramente o conteúdo total do sermão.

(Capítulo 4) A ESTRUTURA DO SERMÃO

Todo sermão precisa de estrutura, independente do tipo ou do propósito. Assim como o nosso corpo é sustentado pelo esqueleto, a estrutura é que dá sustentação ao sermão. Quando falamos de estrutura, referimos nos à organização das ideias de forma que possam ser transmitidas com eficiência. Lembre-se da ilustração acerca do "quebra-cabeças" que usamos no capítulo anterior: o pregador precisa repassar as informações para que o ouvinte vá "montando" o sermão na sua mente, e isso só será possível se o sermão tiver uma boa estrutura.

Uma boa estrutura deve ser elaborada tendo como ponto de partida a situação do ouvinte. Se o pregador inicia o sermão já com as suas principais argumentações, é possível que o ouvinte ainda não esteja preparado para entender o sermão. Por isso o pregador não deve "entrar de sola" no conteúdo que vai expor, mas fazer o trabalho de preparação do ouvinte, conduzindo-o a compreender as argumentações extraídas da Palavra de Deus.

Dessa forma, a primeira parte do sermão deve ser uma boa introdução, o momento em que o pregador "fisga" o ouvinte, despertando o interesse pelo sermão que virá a seguir. Depois, vem uma Narração, que é o ato de colocar o ouvinte "dentro" do texto, a fim de que ele compreenda o que está acontecendo, onde os personagens bíblicos estão, o que estão fazendo, como estão fazendo, ou seja, deve-se repassar todo o "pano de fundo" da passagem bíblica. Só então o pregador lançará o tema do Sermão, que precisa ser bem preparado para que seja empolgante e, ao mesmo tempo, fiel ao texto bíblico, Tendo lançado o tema, o sermão passa a ter as Divisões (ou Argumentações): lições extraídas da biblia que vão compor o tema. As divisões, portanto, são as partes que explicam o tema apresentado. Tendo apresentado todas as divisões, o pregador passa para a Conclusão, que "fecha" o raciocínio, e, depois, para a Aplicação, que mostra qual a utilidade do sermão", Portanto, esta é a estrutura do sermão:

A ESTRUTURA DO SERMÃO 

 1.1 Introdução

 1.2 Narração

 1.3 Tema

1.1 Argumentação 
1.2 Argumentação
1.3 Argumentação 

1.4 Conclusão
1.5 Aplicação

Antes de passarmos a considerar cada parte individualmente, vamos ressaltar que essa estrutura precisa ser feita como um todo. O sermão não pode ter uma parte desconectada das demais, sob o risco de perder a eficácia da pregação, dificultando a compreensão por parte do ouvinte.

Dentro da preparação do sermão, o que primeiro precisa ser produzido é a parte central: o tema e as argumentações. Essa parte é preparada primeiro em virtude de ali estar o conteúdo bíblico que será repassado. É o "cerne" do Sermão. Só depois de feita essa parte é que o pregador vai montar a estratégia para a Introdução e a Narração; e por último é que serão esboçadas a Conclusão e a Aplicação. Por isso, vamos considerar estas partes da estrutura do sermão nesta ordem, que é a ordem que o pregador precisa usar para preparar o sermão.


quinta-feira, 2 de setembro de 2021

(Capítulo 3) OS TIPOS DE SERMÕES

1.1 - A Hermenêutica mantém nosso foco na unidade da Escritura, 

1.2 - e a Exegese nos habilita com os recursos metodológicos, a fim de compreender o texto e transmitilo de forma fiel. Isto nos conduz à terceira disciplina: 

1.3 - a Homilética, que nos propicia a forma de fazê-lo de modo claro, fiel e eficaz.

Definição
A palavra "homilética" é a transliteração do verbo grego que significa "conversar com", "falar". Outra palavra usada é "Homilia", derivada da mesma palavra e significa "associação", "companhia", "conversação", e é encontrada somente uma vez no Novo Testamento, quando Paulo ensina que "as más companhias (homilia¹³) corrompem os bons costumes" (1 Co 15:33). A igreja latina traduziu "Homilia" por "Sermão", passando as duas palavras a serem aplicadas com o mesmo sentido¹³.

A Homilética faz com que o sermão se diferencie de um mero discurso, uma vez que o conteúdo da exposição é a viva Palavra de Deus e tem a ação especial do Espírito Santo agindo na vida dos ouvintes. Entretanto, temos que lembrar de que o texto bíblico não é o sermão; o objetivo do sermão é fazer com que o texto bíblico seja compreendido e aplicado à realidade do ouvinte. É por essa razão que a responsabilidade do pregador se torna imensa, pois sobre seus ombros está o peso de entender a Bíblia e fazê-la compreensível a seus ouvintes. Para esse propósito, o sermão precisa ter estrutura, a fim de que o ouvinte possa "montar" em sua mente as lições principais do texto bíblico.

O pregador deve organizar seus pensamentos em partes que se conectam umas às outras (como num quebra-cabeças), e ir expondo essas partes uma por uma, a fim de que o ouvinte possa ir "montando" o "quebra cabeças" em sua mente. Podemos dizer que houve um bom trabalho na pregação quando, no final aquilo que o ouvinte tem em mente é o mais parecido possível com aquilo que o pregador tinha em mente quando iniciou o sermão, Pois bem, essa é a área da homilética: oferecer ferramentas a fim de que o pregador organize o ensino bíblico e o exponha de forma clara e objetiva.

TIPOS DE SERMÕES 
Com o propósito de organizar o pensamento e estabelecer estratégias de pregação, a homilética classifica os sermões em três tipos distintos:
1.1 TEMÁTICO
1.2 TEXTUAL, 
1.3 e EXPOSITIVO. 

A. O SERMÃO TEMÁTICO 
O sermão temático é aquele cujas argumentações derivam de um tema, independentemente do texto bíblico. Ou seja, o pregador determina o assunto sobre o qual quer pregar, e, então, busca os textos bíblicos que ensinam sobre esse assunto. Por isso é chamado de "temático" o pregador busca textos bíblicos que ensinem as lições principais acerca do tema escolhido. É claro que esse tema Precisa necessariamente ser extraído da Bíblia, senão o sermão não terá conteúdo bíblico. Cada divisão do sermão deverá ser extraída desse tema, e será fundamentada em versículos que podem estar em partes diferentes da
Bíblia. Nesse tipo de sermão, o pregador "passeia" pelos textos bíblicos buscando as instruções acerca do tema que está sendo abordado naquela exposição.

Vamos ilustrar com um esboço de sermão temático:

Tema: "A AÇÃO DO ESPÍRITO SANTO"

1.1 Agiu na Criação (Gn 1.2)
1.2 Agiu no Ministério de Jesus (Mt 3.16)
1.3 Age na Distribuição dos Dons (1 Co 12.11)

Veja que nesse exemplo escolhemos um tema e fomos buscar as argumentações na Bíblia, tendo como princípio a questão temporal: 
1.1 a ação do Espírito Santo no Velho Testamento, 
1.2 a ação do Espírito Santo no Novo Testamento,
1.3 e a ação do Espírito Santo hoje.

Mais um exemplo de sermão Temático:

Tema: "QUEM É JESUS"? 

1.1 Jesus é o Pão da vida (Jo 6.35)
1.2 Jesus é a Luz do Mundo (Jo 8.12)
1.3 Jesus é o Bom Pastor (Jo 10.11)
1.4 Jesus é a Videira Verdadeira (Jo 15.1-7) 

Já nesse exemplo não tivemos a preocupação com a busca de argumentos no Velho Testamento, mas nos limitamos a buscar respostas só no Evangelho de João Poderíamos ter textos dos demais evangelhos, mas, nesse caso, o tema foi esclarecido com textos de um só livro. Este é, portanto, o sermão temático: você escolhe um tema sobre o qual vai pregar, e busca na bíblia os textos com as argumentações que o explicarão. Obviamente, esse tipo de sermão tem vantagens e desvantagens. Podemos alistar como vantagens: a grande variedade de assuntos (porque o pregador não precisa prender-se a um único texto); a facilidade no preparo do sermão (uma vez que a escolha dos textos é aleatória e a critério do pregador); a praticidade (pois o pregador vai falar sobre um assunto que o momento pede); a versatilidade da exposição (porque para o ouvinte o sermão vai ser mais dinâmico), entre vantagens. Entretanto, o sermão temático tem desvantagens: primeiramente, corre-se o risco de o sermão não ser bíblico, caso o pregador preocupe-se tanto com o tema a ponto de "forçar" a bíblia a concordar com seus argumentos. A segunda desvantagem é o risco da parcialidade: o pregador pode selecionar textos que sejam mais favoráveis ao seu raciocínio e deixar de lado textos importantes sobre aquele tema. A terceira desvantagem é a superficialidade: como o pregador vai usar diversos textos, é claro que ele não terá condições de explorar a fundo cada um deles. Assim, ele oferecerá para o ouvinte um "panorama" geral a respeito do que a Bíblia diz sobre aquele tema, sem se aprofundar nas implicações do texto bíblico.

B. O SERMÃO TEXTUAL 
Se o sermão temático inicia-se com um assunto que sai da cabeça do pregador, o Sermão Textual, por sua vez, inicia-se com um texto bíblico, do qual sai o assunto. O Sermão Textual, portanto, é aquele em que o tema e as argumentações são extraídos de um texto bíblico ESPECÍFICO, normalmente um texto pequeno (ou mesmo um só versículo).

Nesse tipo de sermão, o esboço fica estritamente limitado ao texto no qual se baseia o sermão, e o pregador evitará conduzir o ouvinte por outras passagens da Bíblia.

Passemos a ilustrar com alguns exemplos, usando os mesmos temas que usamos no sermão temático:

Tema: "A AÇÃO DO ESPÍRITO SANTO" 
(Jo 16.8-11) 
1.1 Convencer o Mundo do Pecado (v. 9) 
1.2 Convencer o Mundo da Justiça (v. 10) 1.3 Convencer o Mundo do Juízo (v. 11)

Aqui, usamos um texto de Quatro versículos, e o sermão foi a eles limitado. Enquanto no sermão temático buscamos textos do Velho e do Novo Testamento, no sermão textual cada argumentação saiu de um versículo, na mesma ordem que o texto bíblico apresenta.

Vamos ao segundo exemplo:

Tema: "QUEM É JESUS " (Jo 14.6) 
1.1 Jesus é o Caminho
1.2 Jesus é a Verdade
1.3 Jesus é a Vida

Agora, usamos um só versículo para montar o sermão, extraindo o tema e as partes do sermão somente deste versículo. Lembre-se de que no sermão temático nós usamos o mesmo tema, mas buscamos vários textos para montar as argumentações, enquanto que aqui, no sermão textual, não saímos de um só versículo.

O sermão textual é muito usado por pregadores iniciantes, e também tem suas vantagens e desvantagens. Vamos enumerar algumas vantagens. Primeiramente, o sermão textual tem a vantagem do foco: o ouvinte precisa ficar com a Bíblia aberta apenas num texto, sem precisar folheá-la, evitando-se a dispersão do pensamento. Também isso faz com que o sermão tenha mais possibilidade de ser essencialmente bíblico. Em segundo lugar, tem a vantagem de facilitar a vida do pregador, pois o tema e as ideias principais do sermão estão latentes no texto. Finalmente, o sermão textual tem a vantagem de manter o ouvinte atento, uma vez que o sermão segue a sequência natural do texto.

Entre as desvantagens do sermão textual, podemos enumerar algumas: faz com que o pregador não exponha a Bíblia como um todo, porque alguns textos não têm suas ideias tão diretas e claras a ponto de ser usadas no sermão textual; induz ao superficialismo, pois tanto o pregador pode tirar lições que o texto não ensina, como pode deixar de lado implicações importantes no conteúdo total do texto. Promove o desinteresse do ouvinte, caso o pregador não consiga extrair e aplicar as ideias mais profundas do texto. Em outras palavras, se o pregador não vai além do sentido óbvio da passagem (que qualquer pessoa percebe ao ler a Bíblia em casa), o ouvinte pode dispersar a atenção e não aprender o que está sendo ensinado.; tende a exigir do pregador muito esforço para aplicar a mensagem, uma vez que o texto é muito pequeno e tem aplicação limitada.

C. O SERMÃO EXPOSITIVO 
O terceiro tipo de sermão é o Sermão Expositivo, que é aquele em que uma porção mais extensa da Bíblia é interpretada, em relação a um tema ou assunto. A própria definição do Sermão Expositivo mostra que, dos três tipos, este é o mais difícil para o pregador. Esse tipo de sermão extrai do texto bíblico tanto o tema quanto as argumentações, e vai mais além, ao analisar as implicações daquele tema no contexto total da Bíblia. Esse foi o tipo de sermão usado pelos apóstolos nas suas pregações: tomavam um texto ou um ensinamento do Velho Testamento, interpretavam não só o texto, mas também a intenção do autor (ou a intenção de Deus), e faziam a aplicação na vida dos seus Ouvintes. Observe que, no sermão textual, a análise do contexto é muito importante; mas no sermão expositivo essa análise contextual é vital e indispensável, caso contrário, o sermão deixa de ser expositivo. Por exemplo, se o pregador fizer um sermão expositivo sobre a vida e ministério de Daniel, ele terá que partir de uma análise contextual muito ampla, a fim de compreender esse distinto personagem bíblico. Como este é o sermão mais difícil, vamos nos concentrar nele, fazendo a ressalva de que partimos do pressuposto de que o leitor desta obra não teve contato com as línguas originais. virtude de trabalharmos a estrutura desse tipo de sermão de forma mais minuciosa, vamos dispensar no momento exemplos e esboços.

À semelhança dos outros dois tipos de sermão, o expositivo tem vantagens e desvantagens. Passemos a analise das vantagens. Primeiramente, podemos alistar que o sermão expositivo tem a vantagem de propiciar maior garantia de fidelidade na exposição da mensagem de Deus. Como o pregador vai expor um texto específico, analisando-o à luz do todo da Palavra de Deus, ele tem maiores possibilidades de permanecer fiel ao sentido do texto. A segunda vantagem é a imparcialidade da pregação e do pregador; como ele mostrará o sentido fiel do texto, ele não escolhe o que quer pregar. Pelo contrário, pode ser que o próprio pregador não goste da mensagem, ou sinta se incomodado por ela, mas esta é a que vai ser pregada, por ser uma exposição do sentido original do texto. A terceira vantagem do sermão expositivo é que ele evita a superficialidade na apresentação da mensagem bíblica; o texto e as implicações bíblicas daquele ensinamento são explorados ao máximo possível e dificilmente o ouvinte poderia chegar àquelas conclusões com uma leitura rápida. A quarta vantagem é que uma pregação expositiva em um livro da Bíblia livra o pregador de ficar buscando temas para cada sermão. Pelo contrário, a pregação expositiva em um livro fornece automaticamente o ponto de partida para a preparação do sermão. Outra vantagem advinda desta é que o pregador não comete o erro de evitar determinados assuntos: numa série de pregações expositivas em um livro, o próprio texto sagrado vai trazendo o que será estudado, mesmo que o pregador não tivesse a intenção de abordar aquele assunto em suas pregações. Finalmente, podemos lembrar que o sermão expositivo tem a vantagem de alimentar tanto o ouvinte quanto o pregador com alimento sólido, que não vai além do sentido óbvio do texto. E mais ainda: como o pregador vai expor a Palavra de Deus, ele fica com autoridade para pregar sobre qualquer assunto, uma vez que não será sua opinião, mas o ensino sadio da Bíblia.

Quanto às desvantagens do sermão expositivo, podemos citar algumas:
primeiro, é bem mais difícil de preparar. Exige do pregador um estudo exaustivo da Palavra de Deus e versatilidade para aplicar todo o conteúdo resultante desse estudo. A segunda desvantagem é que ele tem o risco de ser um sermão maçante, deixando o ouvinte apático com relação à pregação; isso em virtude do estudo e pesquisa propiciarem ao pregador um conteúdo muito vasto de informações, que, se não forem bem preparadas, podem transformar o sermão numa palestra intelectual acerca das Escrituras Sagradas. Daí a grande importância da Homilética.

Tendo visto os três tipos de sermões, passemos à construção propriamente dita do sermão expositivo, analisando os elementos que o constituem e descobrindo metodologias que a Homilética oferece para a elaboração dessas partes. 

(Capítulo 2) PRINCÍPIOS DE EXEGESE

A palavra exegese é uma transliteração do grego e significa "narração, exposição". É formada por duas palavras gregas: a primeira significa "fora de", e a segunda significa "conduzir, guiar, liderar". O sentido, então, é "tirar", "trazer para fora", "expor", e, aplicando ao texto bíblico, significa "extrair a mensagem do texto". Portanto, a função da exegese bíblica é, humanamente falando, trazer à luz a mensagem da parte de Deus conforme registrada nas Escrituras".

Ao pregar um texto bíblico, temos que ter a submissão à voz de Deus, e, para isso, é preciso entender o que o texto diz e qual o seu significado. A Exegese, portanto, é a "ciência da interpretação" do texto Bíblico. Essa ciência leva o pregador a aprender e a buscar as ferramentas das línguas originais em que foram escritos os livros da Bíblia: o hebraico no Velho Testamento e o grego no Novo Testamento. A boa exegese é feita diretamente na lingua original, trabalho que exige esforço e dedicação do pregador, e que nem sempre está ao alcance da maioria dos pregadores. Por isso, mesmo considerando o trabalho limitado de estudar o texto na nossa lingua sem olhar os originais, alguns princípios de Exegese devem ser observados por qualquer pessoa que queira aprofundar seus estudos e compreensão da Palavra de Deus. Vejamos, então, os princípios da Exegese que devemos aplicar na interpretação do "texto", a fim de iniciar a pesquisa para a montagem do sermão:

1. Defina bem o texto - evite pregar em textos muito pequenos (para não deixar coisas importantes no contexto) ou em textos muito extensos, pois, nesse caso, a exposição poderia ficar superficial. O que se procura num estudo é a definição da "pericope", ou seja, do bloco central de raciocínio de um determinado texto. Lembre-se de que na sua Bíblia, quando um versículo começa com uma letra em negrito, isto indica que no original inicia-se ali um parágrafo. Portanto, nem sempre a edição de nossa Bíblia em português traz os parágrafos minuciosamente divididos."

2. Compare diversas traduções - leia o
texto em outras traduções, pois os tradutores podem dar sinónimos de palavras, e isso facilita seu entendimento, Use a versão Corrigida, Atualizada, na Linguagem de Hoje, Nova Versão Internacional, entre outras e, mesmo que alguma versão não seja tão confiável, "leia tudo e retenha o que é bom." Um exemplo claro disso é o texto de Romanos 7.7, na parte final: a edição de Almeida Revista e Corrigida traz: "...porque eu não conheceria a concupiscência, se a lei não dissesse: Não cobiçarás." E a edição de Almeida Revista e Atualizada diz: "...pois não teria eu conhecido a cobiça, se a lei não dissera: não cobiçarás". Veja que pela simples comparação o pregador entende que "concupiscéncia" quer dizer "cobiça".

3. Analise o contexto do texto - estude o
parágrafo anterior e o parágrafo posterior. Descubra de onde o personagem bíblico está vindo e para onde está indo, o que aconteceu antes e depois do episódio que você está estudando. Lembre-se de analisar o contexto imediato (versículos imediatamente antes e depois do texto) e o contexto remoto (a ideia ou contexto do próprio livro que está sendo estudado). Por exemplo, se o sermão for sobre a "Justificação pela Fé" (Rm 5.1), o contexto próximo seria o capítulo 3, versículo 21, em que começa a argumentação sobre a Justificação, e iria até o final do capítulo 5. O contexto remoto seria o propósito do livro de Romanos como um todo, além da análise de como o processo de justificação acontecia no Velho Testamento.

4. Analise a gramática do texto - tenha em mãos um dicionário de português e anote o significado das palavras que você não conhece. Marque os verbos e faça a ligação entre eles. Separe as perguntas e as respostas que estiverem no texto, marque palavras repetidas, comparações. Jamais passe por cima de termos cujo o significado você não conheça. Se você não sabe, por exemplo, o que quer dizer a palavra "concupiscência", procure num dicionário a fim de aprender, pois do contrário jamais conseguirá interpretar a Bíblia.

5. Defina o tipo de literatura - seu texto está entre os livros históricos? Ou Poéticos? É o texto de um profeta? Está nos Evangelhos? Ou é uma carta? Essa definição é muito importante para compreender o texto. Um sermão no livro de Salmos, por exemplo, tem que ser elaborado considerando que os Salmos foram escritos para serem cantados e, como tal, devem ter interpretação de poesia. Quando o salmista diz "envelheceram os meus ossos", ele pode não querer dizer que está com osteoporose (doença nos ossos), mas talvez esteja dizendo poeticamente que ele estava abatido sem perspectiva de vida.

6. Pesquise o Contexto histórico geográfico - use um dicionário bíblico e entenda quem era o personagem principal do texto, quem era sua família, sua profissão, onde morava, para onde estava indo, quantos quilômetros andou ou iria andar, o que estava comendo ou vestindo, quem era o governador ou Rei. Anote todas as informações que o texto traz, a fim de compreender o que estava acontecendo. Consulte sempre um mapa bíblico, que pode ser achado em algumas edições da Bíblia, ou aos montes e do jeito que precisar por meio de uma pesquisa na internet. Quando Isaías diz, no capítulo 6, "No ano da morte do rei Uzias, eu vi o Senhor..." o pregador deve investigar: quem foi o rei Uzias? Em que ano ele morreu? Quem o substituiu? Quais eram os profetas que estavam em atividade naquela época? O que aconteceu de relevante naquele ano? São as respostas a essas perguntas que capacitarão o pregador a refazer o contexto histórico e geográfico para compreender o texto.

7. Identifique o tema principal - qual é a ideia principal do texto? O que o texto está ensinando? Qual o pensamento dominante? Tem ideias secundárias? Normalmente, a ideia principal do texto indicará o tema que deverá ter a pregação. Podemos citar como exemplo a parábola do Bom Samaritano (Lc 10.25-37). O tema principal não é o homem assaltado, nem mesmo o samaritano. O tema principal é mostrado pela pergunta que gerou a necessidade de Jesus contar a parábola: "Quem é o meu próximo?" (Lc 10.29).

8. Finalmente, pesquise em Comentários Bíblicos - este é o último princípio porque precisa vir por último. Ou seja, só consulte um Comentário do texto depois de passar por todos os princípios acima. Não dispense o comentário, porque é o fruto do árduo trabalho de pessoas que já estudaram o texto e escreveram suas conclusões. Lembre-se apenas de fazer a sua pesquisa, evitando a atitude preguiçosa de não estudar.

Conclusão

A hermenêutica e a Exegese são apenas ferramentas para nos ajudar a entender o texto bíblico. Até aqui ainda não temos nenhuma estrutura de sermão, mas apenas um monte de anotações e observações que nos levaram à compreensão do texto. Com a prática do ministério de pregação, você concluirá que a maior parte dessa pesquisa nem será usada no sermão, mas é material essencial para seus estudos e para sua compreensão da Bíblia. Esse estudo, quando feito de forma sistemática e frequente, levará você a ter seu próprio material de pesquisa, de tal forma que, quando for pregar num texto, possivelmente a pesquisa já estará pronta por tê-la feito num estudo anterior.

O próximo passo é começar a pensar na forma estrutural do texto, que é o início da elaboração do sermão propriamente dito. Essa é a função da HOMILÉTICA, e será estudada no próximo capítulo. 

sábado, 21 de agosto de 2021

(Capitulo 1) PRINCÍPIOS DE HERMENÊUTICA

Antes de tudo, quem se dispõe a pregar a Palavra de Deus tem que buscar a correta interpretação da mesma, a fim de ter o conteúdo para pregar. Essa habilidade de entender e interpretar corretamente a Bíblia é tarefa da Hermenêutica e da Exegese. Estas duas "ciências" oferecem ferramentas para chegarmos a correta interpretação da Palavra, evitando, assim, a pregação de heresias.

Definimos hermenêutica como sendo a ciência e a arte que estuda a interpretação da Bíblia. Etimologicamente, esta palavra vem do grego, "hermeneuo", que significa explicar, traduzir, interpretar. Nas Escrituras, é usada em quatro versículos: João 1.42; 9.7; Hebreus 7.2 e Lucas 24.27. O estudo da Hermenêutica é importante porque cada a pessoa pode ter um ponto de vista diferente ao interpretar um texto bíblico. Esse ponto de vista é influenciado pelo contexto em que vive o leitor, suas experiências, necessidades ou carências, e isso nos força a ter a preocupação de tentar entender o texto por si mesmo, ou seja, independentemente de nossas experiências pessoais.

Como a Bíblia tem diversos tipos de literatura, é preciso entender como interpretar cada uma delas. Um texto poético (Salmos, por exemplo), é muito diferente de um texto Histórico (como 1 Samuel).
A preocupação do autor em um texto poético é diferente do autor em um livro histórico, de tal forma que, no histórico, ele inclui muitos detalhes sobre o contexto, data e governantes, aspectos que não são relevantes quando escreve uma poesia. A interpretação, portanto, precisa considerar esses fatores a fim de levar a uma compreensão exata do que o autor quis dizer. Vejamos, então, de forma sucinta, as principais leis da hermenêutica bíblica:

1. Princípio da Autoridade Interna
Ao estudar a Bíblia, temos que considerar, antes de tudo, que cada texto bíblico, apesar de ter mais de uma aplicação (falaremos nisso mais à frente), tem um só significado. Nossa tarefa, portanto, é buscar o sentido real do texto e aplicá-lo. O Antigo Testamento produziu o Novo Testamento e o Novo Testamento está contido no Antigo Testamento. Não é a Igreja que autentica a Palavra por sua interpretação; é a Bíblia que autentica a si mesma como Palavra autoritativa de Deus.

2. Princípio do Contexto
Contexto é a parte que vem antes ou depois do texto. Não devemos interpretar um texto sem verificar o seu contexto, pois este ajudará a compreender o significado daquele. Se quisermos pregar no Salmo 51, por exemplo, teremos que analisar o texto de 2 Samuel 12:1-15, porque o próprio cabeçalho de nossa tradução em português mostra que o contexto no qual Davi escreveu o Salmo 51 foi imediatamente após ter sido repreendido pelo profeta Natã. Estudando os dois textos juntos, podemos entender a angústia e sinceridade de Davi quando ficou contrito diante de Deus. Por isso, o contexto é importante; vamos falar de forma mais minuciosa sobre o contexto no próximo capítulo, ao estudarmos os princípios da Exegese.

3. Princípio do Texto Paralelo
A Bíblia interpreta a si mesma (1 Co 2.13). Quando um determinado acontecimento é descrito por mais de um autor, esse texto deve ser auxiliado na sua interpretação utilizando o mesmo assunto que ocorre em outras partes das Escrituras Sagradas. Por exemplo, quando pregamos sobre um texto de qualquer evangelho, temos que ver o que os outros evangelistas escreveram sobre o mesmo assunto, pois as informações complementam e ajudam a entender o texto. Vejamos um exemplo: Na primeira multiplicação dos pães (Mt 14:13-21), Jesus pergunta para os discípulos o que eles tinham em mãos, e eles afirmam que só tinham cinco pães e dois peixes (Mt 14:17). Pois bem, o texto de Lucas informa que eles foram para a região de Betsaida T<9.10) Marcos diz que precisavam ter duzentos denários (denário era o salário de um trabalhador por um dia de trabalho) para comprar alimento para toda aquela gente (Mc 6:37) e João informa que os cinco pães e dois peixes nem eram dos discípulos, mas de um rapaz que estava no meio da multidão (Jo 6.9). Veja que são muitas informações complementares, mas não estão todas em um só texto. Isso se aplica a toda a Bíblia. 

4. Princípio da Autoria do Texto
Os diferentes autores da Bíblia viveram em tempos, culturas, situações sociais e regiões diferentes. Portanto, a forma de interpretar um determinado texto será diferente da forma de interpretar outro texto, escrito por outra pessoa em outro contexto. Pedro, por exemplo, escreve sua primeira carta aos "forasteiros da Dispersão" (1 Pe 1:1), ou seja, crentes que estavam vivendo fora de Jerusalém, no meio da sociedade de gentios. Isso tem grande impacto na forma dele escrever e na forma de interpretarmos o texto hoje.

5. Princípio da Interpretação do Texto
A interpretação do texto é aquilo que a passagem quer dizer no tempo, no espaço e nas circunstâncias em que foi escritas, no estilo em que foi escrita. Alguns textos têm significado literal, outros têm significado simbólico. Um exemplo claro disso é a afirmação de Jesus em João 2.19- "Jesus lhes responden: Destrui este santuário, e em três dias o reconstruire?". Um leitor desavisado poderia pensar, como pensaram os fariseus, que Jesus estava se referindo ao Templo de Jerusalém, que levou 46 anos para ser construído.

Esses princípios, se observados na hora de entender o texto, orientarão e levarão a uma correta compreensão do texto que estaremos pregando. Por isso, a Hermenêutica tem seu valor reconhecido: ela nos aproxima do texto e do seu sentido e significado corretos, fortalece a nossa convicção na revelação que Deus fez na Sua Palavra, enaltece a Soberania de Deus que preservou a escrita até hoje, coloca-nos na linha da história da igreja, traz equilíbrio entre conteúdo (revelação) e comportamento (ética, exigência de Deus), ajuda na determinação do que é permanente e do que é temporário, evita o desvio e mantém a unidade da revelação.